A qualidade de vida dos brasileiros é impactada negativamente pelo trânsito. Um estudo realizado pela Ipsos estima que, em média, perde-se 1h20 em deslocamentos de ida e volta para as principais atividades do dia. Quando somados, chegam a 32 dias por ano. Além de estresse, atrasos, acidentes e vidas interrompidas, o custo com congestionamento no país chega a R$ 267 bilhões por ano, o que corresponde a cerca de 4% do PIB.
Não é nenhum segredo que o modelo de mobilidade ao qual nos habituamos foi pensado para os automóveis e não para as pessoas. Um caminho para mudança deste cenário seria entender a cultura e como funcionam algumas das cidades consideradas referências mundiais em mobilidade, onde a marca registrada é o estímulo a modais que dispensem o uso de carros particulares.
Neste contexto, a cidade de Copenhague, na Dinamarca, é conhecida mundialmente pela cultura de valorização da bicicleta, afinal, metade da população se locomove com ela. Junto ao uso das bikes, por exemplo, o sistema de sinais de tráfego inteligentes consegue identificar a aproximação de veículos nas vias (sejam eles bicicletas, carros ou ônibus). Além disso, a quantidade de ciclistas que se aproximam do cruzamento é detectada, portanto, o semáforo fica aberto por mais tempo, de acordo com a quantidade de pessoas, permitindo que todos cruzem as ruas.
Outro modelo interessante é o de Zurique, na Suíça, onde a maioria da população se locomove a pé ou com auxílio de dois modais: ônibus e trams – que funciona como um bonde sobre trilhos. Por lá, a cada 300 metros é possível encontrar um ponto de ônibus ou tram. Além disso, medidas sustentáveis, como a troca de ônibus a diesel por elétricos, e o investimento em ciclovias ajudam a deixar a cidade menos poluente.
Qual o caminho para o Brasil?
Comecemos por soluções que vieram para ficar e têm transformado a mobilidade brasileira. A regulamentação de apps de transporte e o compartilhamento de bicicletas e patinetes é um acerto. Porém, é necessário repensar os conceitos e inserir as pessoas como protagonistas do trânsito, começando pela infraestrutura, passando por debates e criação de políticas públicas.
O primeiro passo para o futuro da mobilidade humana, que pensa primeiro nas pessoas, é compreender as características, necessidades e possíveis deficiências dos cidadãos. A partir disso, seremos capazes de implementar melhorias nas cidades, como calçadas transitáveis para deficientes físicos e carrinhos de bebê, ampliação da extensão de ciclovias e ciclofaixas, além do investimento em espaços adequados para os recém-chegados patinetes elétricos. Para isso, é fundamental a promoção de debates entre órgãos públicos, empresas privadas e sociedade, pois a colaboração de todas as partes traria mais ideias e vantagens para a população.
Ações permanentes de conscientização
Investir em ações permanentes de conscientização de trânsito ajudaria não somente a mobilidade, mas também a segurança das pessoas que se locomovem. Em um país no qual mais de 40 mil pessoas morrem por ano no trânsito, contentar-se com campanhas sazonais, como o Maio Amarelo e a Semana Nacional do Trânsito, parece pouco.
Recentemente, uma campanha interativa voltada aos riscos no trânsito chamou a atenção por sua originalidade. Com o mote “O trânsito não é um jogo. Uma escolha errada vale a sua vida!”, um vídeo interativo, desenvolvido pelo Instituto Mobih, apresenta as principais causas de acidentes no país e estimula a reflexão de que ações praticadas corriqueiramente no trânsito – sejam pela pressa, distração ou imprudência – têm consequências graves.
Considerando que os acidentes de trânsito são o primeiro responsável pela morte de jovens, na faixa de 15 a 29 anos, o vídeo foi um acerto por usar formato inovador e linguagem dinâmica, que falam ‘a língua dos jovens’.
Nele, o espectador pode decidir o final da história a partir de escolhas por tipo de modal e trajetos, ao mesmo tempo em que é alertado sobre infrações e perigos no trânsito. A ideia segue uma tendência de sucesso mundial, popularizada com a Netflix, na série Black Mirror.
O resultado? Em menos de um mês, cerca de 90 mil pessoas interagiram com a campanha. A reflexão que fica é: se com uma ideia criativa, o interesse, engajamento e impacto foram positivos, como seria a cultura brasileira de trânsito se houvessem mais ações assim?
Fonte: Cristiano Caporici