Extrema comemorará o Dia da Luta Antimanicomial

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“Aquele carro parara na linha de resguardo, desde a véspera, tinha vindo com o expresso do Rio, e estava lá, no desvio de dentro, na esplanada da estação. Não era um vagão comum de passageiros, de primeira, só que mais vistoso, todo novo. A gente reparando, notava as diferenças. Assim repartido em dois, num dos cômodos as janelas sendo de grades, feito as de cadeia, para os presos. A gente sabia que, com pouco, ele ia rodar de volta, atrelado ao expresso dai de baixo, fazendo parte da composição. Ia servir para levar duas mulheres, para longe, para sempre”. Assim começa o conto “Sorôco, sua mãe, sua filha” escrito por Guimarães Rosa e publicado em 1962 no livro Primeiras Estórias. No conto Guimarães descreve a despedida de Sôroco, homem simples do interior, que envia sua mãe e sua filha “enlouquecidas” para o Hospital Colônia de Barbacena.

Apesar da peça literária ser ficcional ela conta uma história que foi real para milhares de pessoas. Criado em 1903 para ser um local de tratamento para pessoas com transtornos mentais o Hospital Colônia de Barbacena foi um manicômio que por 80 anos serviu de depósito para diversos tipos de “rejeitados sociais”. Ali eram internados não só os “loucos”, mas andarilhos, crianças indesejadas, alcoolistas, deficientes mentais e até dissidentes políticos. O “Colônia”, como ficou conhecido, recebia toda semana dezenas de pessoas trazidas pelos trens que vinham de todas as regiões do estado de Minas Gerais, tornando famosa a expressão mineira “trem de doido”. Os vagões eram de carga e se assemelhavam muito à forma como os nazistas levavam os judeus para os campos de concentração. A semelhança com o holocausto não termina aí, o próprio hospital lembrava um campo de concentração, pois as condições eram tão terríveis que retiravam a condição de ser humano das pessoas deixadas ali para morrerem. A tortura era prática corrente no cotidiano do “Colônia” nas quais eram usados indiscriminadamente os eletrochoques, espancamentos e até “solitárias”. O “Côlonia” possuía um cemitério próprio, o que indica que ali a expectativa não era a recuperação de seus internos, mas sim a morte. No total 60 mil brasileiros morreram esquecidos ali. Morria-se por fome, frio e até por diarreia. Os corpos, que abundavam principalmente no inverno, chegaram a ser comercializados clandestinamente como peças anatômicas para as faculdades de medicina.

Entre os as décadas de 1960 e 1970 começaram a surgir as primeiras denúncias da imprensa sobre as condições das pessoas ali internadas, e assim como o “Colônia”, haviam diversos hospitais psiquiátricos espalhados pelo Brasil que repetiam a mesma situação de violência e degradação. No início da década de 1980 grupos de profissionais da saúde começaram a se organizar para mudar essa dura realidade e em 1986 o Movimento da Luta Antimanicomial foi criado com o objetivo de substituir os manicômios por outros serviços que tivessem como princípios a liberdade e a dignidade das pessoas com transtornos mentais e foi instituído o dia 18 de maio como o Dia da Luta Antimanicomial

Em 1989 o deputado federal Paulo Delgado propôs um projeto de lei para mudar a política nacional de saúde mental com o intuito de instituir o fim dos manicômios e após 11 anos de tramitação no Congresso Nacional e muitos confrontos com os setores conservadores da sociedade que lucraram muito com a “indústria da loucura” o projeto foi aprovado. Hoje a lei 10.216 de 2001 garante a proteção e os direitos das pessoas com transtornos mentais e modifica o modelo assistencial em saúde mental. Com essa nova lei o SUS efetivou a criação dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) que passaram a ser a referência no tratamento de pessoas com transtornos mentais graves e gradativamente foram sendo fechados os antigos manicômios.

Em Extrema o CAPS existe há 10 anos e nesse tempo se firmou como uma instituição que tem substituído o hospital psiquiátrico, uma vez que já há alguns anos o município zerou o número de internações por transtorno mental. Hoje quem precisa de assistência em saúde mental em Extrema pode frequentar o CAPS diariamente sem ter que ser privado da sua liberdade ou do convívio com a família, com os amigos e sua comunidade. O CAPS atente de portas abertas e oferece mais do que atendimento médico e psicológico, há uma equipe multiprofissional com diversos profissionais que proporciona acolhimento, convívio, ajuda, carinho, cuidado, esperança e orientação. Além dos atendimentos individuais são realizados acompanhamentos em grupo e oficinas terapêuticas que desenvolvem as habilidades sociais, a expressão de sentimentos, a cidadania, o pertencimento e o acesso aos espaços públicos e à vida em comunidade.

Para celebrar as conquistas e fortalecer a luta contra o preconceito e a exclusão das pessoas com transtorno mental o grupo musical Loucarmonia, formado por usuários e trabalhadores do CAPS, convida a todos para uma apresentação cultural na praça Getúlio Vargas no dia 19 de maio, às 10:00h. Vamos todos juntos lutar pó uma sociedade sem manicômios!

Fonte: Ascom/Prefeitura de Extrema

 

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