a) Porque, numa tal condição (de estado de natureza), “não há lugar para o trabalho [investimento, empreendimento, criação de empregos etc.], pois o seu fruto é incerto; consequentemente, não há cultivo da terra; nem navegação, nem uso das mercadorias que podem ser importadas pelo mar; não há construções confortáveis, nem instrumentos para mover e remover as coisas que precisam de grande força; não há conhecimento da face da Terra, nem cômputo do tempo; nem artes, nem letras; não há sociedade; e o que se é pior que tudo, um medo contínuo e perigo de morte violenta. Trata-se de uma vida solitária, miserável, sórdida, brutal e curta” (Hobbes, Leviatã, cap. XIII);
(b) Porque no estado de natureza (ou anomia quase absoluta) se perde a noção do que é justo e injusto, certo ou errado: “Desta guerra de todos os homens contra todos os homens também isto é consequência: que nada pode ser injusto. As noções de certo e de errado, de justiça e injustiça, não podem aí ter lugar. Onde não há poder comum não há lei [ou não há lei eficaz], e onde não há lei [ou lei efetiva] não há injustiça. Na guerra, a força e a fraude são as duas virtudes cardeais. A justiça e a injustiça não fazem parte das faculdades do corpo ou do espírito”. (Hobbes, cit.);
(c) Porque nesse estado de natureza (de anomia profunda) “não há propriedade, nem domínio, nem distinção entre o meu o teu; só pertence a cada homem aquilo que ele é capaz de conseguir, e apenas enquanto for capaz de o conservar. É pois nesta miserável condição que o homem realmente se encontra, por obra da simples natureza, embora com uma possibilidade de escapar a ela, que em parte reside nas paixões e em parte na sua razão” (Hobbes, cit.). Há saída para o estado selvagem? Hobbes diz que sim e apresenta dois requisitos: (a) a razão (que sempre sugere normas de paz) e (b) as paixões (medo da morte, desejo daquelas coisas que são necessárias para uma vida confortável e a esperança de as conseguir por meio do trabalho) (Hobbes, Leviatã, cap. XIII). Numa outra visão, eu diria: (a) prazer de viver moderadamente, como diria Lucrécio (porque o medo da morte só traz infelicidade), (b) qualidade de vida e (c) preparação para o exercício e busca por um trabalho digno (que possibilite as necessidades anteriores).
Luíz Flavio, Jurista.